Mes defendem suspenso do calendrio de escolas durante crise do coronavrus 2n6ad
Publicado em 22/04/2020
Editoria: Educao
ado um ms do fechamento das escolas na maior parte do Brasil, alguns pais comeam a se perguntar se o ensino remoto, sobretudo para os mais jovens, seria mesmo a melhor opo, e surgem os que defendem a suspenso do contedo curricular enquanto no for possvel voltar s escolas.
Como opo s disciplinas tradicionais, as escolas poderiam auxiliar os alunos e suas famlias a lidar com as novidades na rotina impostas pela pandemia, opinam.
Na semana ada, um texto de uma me rejeitando as aulas online circulou nas redes sociais e em grupos de pais. Publicado no perfil Quartinho da Dany, que trata de assuntos da infncia, o post defende que a sade mental e emocional tenha prioridade sobre conteudismo, e fala do fingimento da escola e do aluno, aquela finge que ensina e este, que aprende.
O texto de Danyelle Santos, me de um menino de 6 anos e de outro de 16, ambos matriculados na rede privada. Ela conta que o mais novo, em fase de alfabetizao, tem recebido uma avalanche de atividades e que o mais velho, no terceiro ano do ensino mdio, tem feito as tarefas, obrigatrias, por medo de perder nota. Segundo ela, o contedo das aulas do filho mais velho est descolado da realidade da pandemia.
Danyelle Santos comemora seu aniversrio em isolamento com os filhos; vemos a me sentada mesa, com o filho menor no colo, enquanto o maior, adolescente, est de p atrs da cadeira dela; na mesa, um bolo de chocolate com creme e morangos e um prato de brigadeiros.
Busco deix-los tranquilos em relao escola, que entendam que tudo bem estar sem concentrao. Est difcil para mim que sou adulta. Eles no esto alheios ao que est acontecendo s porque so crianas e adolescentes, diz a professora de ingls de Niteri.
Santos diz ainda no estar vendo efetividade no ensino remoto, e que, assim como ela, os pais no esto preparados para ajudar seus filhos no aprendizado. No caso dela, com o filho mais novo, para alfabetiz-lo. No vejo possibilidade de continuar o ano letivo. No tem como a gente voltar sem ter de retomar de onde paramos em maro, diz.
Desconsiderar os meses de isolamento tambm o que defende a gestora cultural Consuelo Bassanesi, que tem uma filha de nove anos matriculada na rede municipal do Rio de Janeiro. Para ela, h aprendizados mais importantes neste momento do que os que preveem os currculos escolares.
Consuelo Bassanesi e sua filha, Agnes, preparam, em casa, marmitas para o coletivo Mais Amor Menos Capital, no Rio; vemos me e filha, usando mscaras de tecido, preenchendo com comida caseira uma srie de quentinhas sobre uma mesa.
A escola deveria pensar como lidar com o trauma, diz. Estamos falando de crianas que vo perder familiares, que esto sendo expostas violncia domstica num grau maior do que antes, de famlias que esto ando dificuldades, fome, presas em espaos muito pequenos.
Quais so as ferramentas emocionais que poderiam ser compartilhadas com as famlias?, pergunta ela, que diz acreditar no despreparo das escolas, privadas e pblicas, em lidar com esses temas, por terem colocado nfase nos contedos em detrimento da formao emocional.
Para a especialista em polticas educacionais Juliana Bicalho, lidar tambm com o emocional funo da escola. A escola no existe s para ar contedo curricular, tambm para formar o ser humano de forma integral, diz.
Segundo Bicalho, a escola deveria trabalhar temas relativos pandemia, fomentando discusses em torno de assuntos que no fazem parte do currculo, mas que podem ajudar alunos e suas famlias a viverem este momento.
De repente nosso planeta est de cabea para baixo, e a escola poderia curmprir um papel importante, de forma ldica e contextualizando aquilo que se ensina, diz o pedagogo Welson Barbosa Santos, que atua, como professor da Universidade Federal de Gois, na formao de professores de escolas rurais.
Deveramos tratar do valor da vida, da importncia do dilogo, do brincar. papel da escola conscientizar a sociedade sobre o que est acontecendo e os riscos pelos quais estamos ando, completa
A valorizao do conhecimento cientfico feita pela escola pode ajudar as famlias, frisa ainda Bicalho. Vivemos num pas em que muitas pessoas consomem e compartilham informaes falsas, e a escola poderia ajudar o Brasil tambm nesse sentido, diz ela.
Professora da Universidade Estadual de Londrina, ela chama a ateno para um outro problema da educao a distncia: o aprofundamento das desigualdades entre os alunos.
No apenas o o internet no universalizado no pas como, mesmo que haja material didtico fsico e aulas pela televiso ou rdio, os alunos da educao bsica no tm a autonomia que o ensino distncia exige, precisando sempre da ajuda de um adulto.
A disponibilidade dessa ajuda e sua efetividade tambm desigual entre os alunos, seja pela ausncia de um responsvel na casa, seja pelo preparo que ele tem. O ensino remoto est batendo muito na tecla da parceria entre famlia e escola, mas temos que pensar que nem toda famlia vai conseguir exercer essa parceria da forma que ela deveria ser feita, diz.
Renata Almeida, professora de ensino fundamental da rede municipal de Londrina, sublinha a importncia do espao da escola, privilegiado, segundo ela, para garantir que as diferenas originrias dos alunos sejam deixadas de lado em busca de uma igualdade de oportunidades na educao.
Por mais heterogneo que o espao da escola seja, quando o professor tem a clareza do trabalho pedaggico, ele pratica a equidade no ensinar; papel do professor promover igualdade entre os alunos, diz. Para ela, fora do espao escolar a igualdade est ameaada.
Tem sido atribudo indiretamente famlia um papel muito mais central, mais importante na aprendizagem do que o do professor, mas ensinar no para qualquer um, diz Bicalho. Quando atribumos aos pais o papel de ensinar, banalizamos o papel do professor e o da escola, como se qualquer um pudesse aprender em qualquer lugar com qualquer pessoa, e no assim, completa ela.
Embora os municpios e estados tenham autonomia para mexer no calendrio escolar, cabe ao MEC regular, tambm para as escolas privadas, as cargas horrias do ano letivo. At o momento, o MEC flexibilizou a exigncia dos 200 dias letivos, mas manteve a das 800 horas de aulas.
Procurado, o MEC diz no haver discusses internas sobre reavaliar as exigncias ou suspender o calendrio. Por enquanto tambm est mantida a data do Enem, ainda que estudantes do ensino mdio, sobretudo aqueles das escolas pblicas, no estejam aprendendo o contedo como o esperado.
O Ministrio Pblico do Rio de Janeiro entrou com uma ao civil pblica nesta semana pedindo a suspenso das aulas virtuais da rede estadual de ensino, que comearam no ltimo dia 13.
Segundo o MP, o estado esqueceu os alunos que no tm o a internet, estimados em 20% dos matriculados, cerca de 150 mil jovens. O Promotoria diz ainda que mesmo os estudantes que possuem telefones com internet teriam precrio ensino por meio de uma tela de quatro polegadas, uma afronta exigncia constitucional de qualidade da educao.
FONTE: Folha