Sobrevivente de feminicdio ajuda a tirar mulheres do ciclo da violncia 4r6n6v
Publicado em 26/03/2019
Editoria: Regio
Eu sempre acreditei que casamento era para sempre e lutava para manter meu relacionamento, at que um dia ele tentou me estrangular. A fala de Bruna Oliveira dos Santos, de 29 anos. Diferente de outros casos como o da violonista Mayara Amaral, covardemente assassinada em julho de 2017, em Campo Grande, a histria que voc vai ler agora tem um final feliz.
Aps sobreviver a uma tentativa de feminicdio Bruna procurou ajuda e orientao do Estado, ando por diversos setores at chegar no Centro Especializado de Atendimento Mulher (CEAM) Cua MBaret, na Capital. Foi l que recebeu apoio psicolgico para recomear sua vida. Hoje ela atua como tcnica e palestrante na Subsecretaria de Polticas Pblicas para Mulheres de Mato Grosso do Sul (SPPM-MS), encorajando mulheres que am por situaes de violncia. Assim que sa do hospital resolvi procurar ajuda do estado e depois de muita terapia e acompanhamento no CEAM eu descobri meu potencial e vi a diferena que eu podia fazer na vida de outras mulheres. Cada vez que contava a elas o que ei, eu evolua mais rpido, revela Bruna.
O incio
No Brasil, at o final do sculo 19 era considerado lcito um marido trado matar a esposa em flagrante delito, sob o argumento de defesa da honra. Pois . Ainda h poucas dcadas agressores assim s recebiam penas leves, alegando crime ional conduzido por amor.
E era exatamente com essas palavras, por amor, que o agressor de Bruna se desculpava todas as vezes que a violentava durante o casamento, em Campo Grande. No incio era maravilhoso, ele me agradava de todas as formas, mas logo ou a me controlar, manipular meus pensamentos, vontades, me chamava de feia, dizia que eu no era inteligente e queria escolher tudo para mim. Eu achava que era normal, uma forma de carinho, at sofrer a primeira agresso fsica. Depois que me batia ele sempre pedia desculpas, dizia que era uma forma de mostrar que me amava, que se preocupava comigo e eu tinha esperana de que isso poderia melhorar.
O ciclo da violncia
Mas no melhorou. Em fevereiro de 2017, aps sete anos sofrendo inmeros abusos e violncia dentro de casa, Bruna consegue se separar. Mas a insistncia do ex-companheiro despertou novamente nela compaixo. Eu sentia muita falta dele e acabamos voltando em julho do mesmo ano, alegou. Tudo parecia bem at que um dia, aps uma discusso, Bruna quase perde a vida estrangulada pelas mos do marido. Em setembro de 2017 nos separamos pela segunda e ltima vez. Sempre que me dava socos me pedia desculpas em seguida, mas nesse dia eu no aceitei e ele comeou a me estrangular. Eu consegui fugir e iniciei o processo de separao.
Algum tempo ou, o agressor parecia ter aceitado tranquilamente a separao e at iniciou outro relacionamento. Bruna voltou para o mesmo lar e ou a morar sozinha. At que no dia 4 de novembro, s 4 horas da madrugada, aps um dia exaustivo de trabalho ela acorda com pancadas de capacete na cabea. Desnorteada, s percebeu o que estava acontecendo quando saiu do quarto, encontrou um facho de luz e reconheceu o agressor. Mas o pior ainda estava por vir.
Ele pulou o muro, invadiu minha casa e me espancou ainda dormindo. Acordei sem saber o que estava acontecendo, ele me batia com o capacete e com tudo o que via pela frente. Tentei proteger meu rosto com as mos, foi quando ele pegou um p de cabra e quebrou meu brao em dois pedaos e continuou a golpear minha cabea na frente de casa, detalhou.
A perseguio seguiu por seis quadras. Bruna pedia ajuda nas casas e nas ruas, mas as pessoas recusavam. Com muito sangue no corpo, de madrugada, descala e vestindo apenas a camisola que usava para dormir, no foi difcil obter desprezo e medo da populao que acordou com os gritos de socorro.
Parecia que eu estava em um pesadelo e no conseguia acordar. Eu corria com o corte na cabea, segurando meu brao quebrado. Cheguei a achar que estava chovendo, mas era meu sangue que escorria. As pessoas me viam, mas recusavam ajuda. Ele me encontrava na rua, me batia e saa. Logo ele voltava e batia de novo, at que cheguei em uma avenida e l ele me atropelou. Fiquei cada no asfalto sem acreditar no que estava acontecendo, foi quando ele desceu da moto e comeou a chutar minha cabea. Naquele momento eu desisti de viver, confessou Bruna.
Quando retornou conscincia viu pessoas ao seu redor e conseguiu ouvir a conversa entre elas. Seu agressor justificava o ato inventando que havia sido trado e que a violentou por cimes. Conhecendo a sociedade e seus julgamentos no difcil acreditar no que acontece depois: Escutei ele dizendo que era meu marido e que me pegou em flagrante traindo ele, por isso agiu sem pensar. Alguns diziam que foi merecido, outros no quiseram se envolver no que eles julgavam ser uma briga de marido e mulher. No momento em que o soltaram e entenderam a teoria dele, ele aproveitou e fugiu. Logo as pessoas tambm se afastaram e novamente fiquei sozinha at receber ajuda de verdade e ser levada ao hospital.
Rompendo ciclos
O pesadelo acabou. Hoje a vida de Bruna ajudar outras mulheres a romperem com o ciclo da violncia domstica (tenso, ato da violncia e reconciliao) e evitar que virem estatstica de feminicdio.
Logo aps receber alta da internao da qual ou por duas cirurgias, ela abriu um boletim de ocorrncia na Delegacia Especializada de Atendimento Mulher (DEAM), rgo com atendimento 24h que protege e investiga crimes de violncia domstica e sexual. De l foi atendida na Casa da Mulher Brasileira onde ou por uma triagem especial at ser acolhida no CEAM. Foi l que avistou um novo facho de luz que desta vez iluminava apenas a esperana de um recomeo.
No Centro Especializado de Atendimento Mulher comecei a entender melhor o ciclo da violncia e vi que ela acontece todos os dias com inmeras mulheres. Meu futuro se abriu. Decidi que minha vida seria lutar para que outras mulheres no em pelo que ei. gratificante levar meu depoimento e ver que elas se identificam e podem romper seus ciclos ouvindo a histria de outra pessoa, afirmou.
Polticas pblicas para mulheres
Considerada uma pandemia global pela Organizao das Naes Unidas (ONU), a violncia contra a mulher tem aumentado desenfreadamente. Em contrapartida, nos ltimos anos as polticas pblicas para as mulheres conquistaram ateno especial do Governo do Estado. Em Mato Grosso do Sul o rgo gestor a Subsecretaria de Polticas Pblica para as Mulheres (SPPM), ligada diretamente a Secretaria Subsecretaria Especial de Cidadania (Secid) por meio da Secretaria de Estado de Governo e Gesto Estratgica (Segov). ela quem dialoga e articula com os diversos segmentos da sociedade civil, executando programas e aes que garantam a cidadania plena das mulheres.
O Mato Grosso do Sul sem dvida um dos Estados mais comprometidos com as polticas pblicas para a mulher. Muitas ainda no percebem que esto presas em um ciclo perigoso do qual correm risco de vida. a que o Governo do Estado tem um papel fundamental de apoio s vtimas de violncia, tanto de acolhimento quanto de conscientizao, no meu caso me ajudou em todas as esferas, finalizou Bruna.
(Assista ovdeocom depoimento da Bruna)
FONTE: Subsecretaria Especial de Cidadania (Secid).